Inicialmente, vou elucidar o que o autor formula sobre a dor de amar: é uma ruptura no laço íntimo com o ser amado. Àquele que foi escolhido para viver junto se afasta e o afeto empregado é desfeito.
Antes disso, instala-se o amor que é, na realidade, a representação feita do ser amado, ou seja, é a fantasia do outro no próprio inconsciente. Podemos pensar que amar, para Nasio e para a psicanálise, é também idealizar o escolhido. Amamos a nós mesmos que está representado no outro, em outras palavras, nos colocamos no ser amado. Freud diz que o escolhido por nós é um personagem psíquico, virtual, diferente da pessoa viva, pois nele está uma parte inconsciente de nós mesmos. O sujeito amado é uma parte real e outra parte de mim que está impressa nele. Contudo, o amor não vem acompanhado apenas de bons aspectos, cobrimos no ser amado muitas representações de amor, ódio ou angústia engendradas no nosso inconsciente. Por isso, amamos um ser híbrido que é um indivíduo real e atuante, mas também sua presença fantasiada e inconsciente de nós. E a fantasia de cada um será um laço tanto mais apertado quanto mais eu for para o outro aquilo que ele é para mim: o eleito fantasiado, segundo Nasio.
Por outro lado, o corpo do amado é preciso estar vivo, em carne e osso, para servir de base à nossa fantasia. Sem essa base real a fantasia desabaria e o inconsciente perderia seu centro de gravidade. Além disso, é esse corpo vivo que excita e estimula o desejo do outro, e suas manifestações, ações e jeito singular também são projetados no psiquismo de quem ama. A presença imaginária do eleito no nosso inconsciente reflete e envia nossas próprias imagens, conforme assinala Nasio.
No livro, o autor diz que esse amor, como sendo uma representação inconsciente de nós mesmos, é alimentado pelo desejo. A incompletude do amor do outro permite que o desejo de quem ama permaneça ativo, uma vez que o outro não deverá ser total para que se possa continuar desejando-o. Nosso parceiro (a) nos insatisfaz porque não pode e não quer nos satisfazer plenamente. Então, ao mesmo tempo em que me incita a amá-lo, me proporciona um gozo parcial. Desse modo, garante a insatisfação necessária para o jogo do desejo.
Perder esse amor que é tão importante como um braço ou uma perna é se ver no vazio e no real. O desejo que estava sustentado, a fantasia que estava presente e a relação que se dava de forma dinâmica é rompida, dilacerando o sujeito que ama. O que dói é a certeza do irreparável da perda do amado. Quanto mais se ama, mais se sofre porque o laço é perdido de forma abrupta e o desejo já não está mais presente. Instala-se o sofrimento e a dor da perda do objeto a. Não haverá mais investimento libidinal e o sujeito se sente despedaçado, lesionado, como arremata Nasio. Ele diz: o que dói não é perder o ser amado, mas continuar a amá-lo mais do que nunca, mesmo sabendo-o irremediavelmente perdido.
A perda do amado é uma dor dentro de nós porque desencadeia o desmoronamento da fantasia. O sujeito se sente, portanto, abandonado, perdido e sem saber o que fazer com o desejo errante. O desejo passa a ser nu e sem objeto. A dor provém da perda do amado, do abalo da fantasia que nos liga a ele e, também, da fratura da imagem do outro. Em suma, a dor de amar é exprimida pelo encontro agressivo e imediato entre o sujeito e o próprio desejo enlouquecido e desestruturado, segundo o autor.
Por fim, o amado que foi eleito por nós através de inúmeras representações psíquicas e que, por isso mesmo, é encontrada uma parte de mim nele se desfaz, é amputada e rompida seja pela morte, pelo abandono ou pela humilhação. Neste momento, instala-se a dor de amar e a dor psíquica porque o laço e a união foram cortados e o indivíduo foi perdido para sempre. A fantasia feita por cada um de nós com a imagem e o corpo do outro desaba e o desejo fica sem objeto, ou seja, fica manco, instável e morto. Diante da desordem pulsional, o sujeito que perde o ser amado sofre e deverá viver o luto para que, algum tempo depois, se veja curado e com sua dor cicatrizada. Após a elaboração da perda e sua simbolização, o indivíduo será capaz de eleger outra pessoa, única e indispensável. Sim, neste momento poderá amar de novo.